20 novembro 2022

O Bibliófilo

 

Aproveitei os dias de descanso pós eleições para pôr a leitura em dia. Sou um contumaz leitor de livros que os últimos nove meses de atividades compromissadas com a campanha eleitoral, gestaram em mim um indivíduo em crise de abstinência.

Delirium tremens, nem deu tempo de ir à livraria em busca das muitas novidades já anotadas em minha mente. Comecei, na primeira semana de novembro, relendo O Homem que Amava os Cachorros, do cubano Leonardo Padura, e Vinicius Portenho, um livro da jornalista argentina Liana Wenner, sobre a temporada em que Vinicius de Moraes viveu em Buenos Aires e Montevidéu nos anos 1960 e 1970 e que me foi presenteado pelo querido amigo Clínio Guimarães.

Controlada a ansiedade fui a livraria e reabasteci minha biblioteca. O Terceiro Excluído, de Fernando Haddad, A Mão e a Luva, do cientista político Alberto Carlos Almeida – este, uma indicação do amigo, irmão e filósofo de estimação, Cássio Murilo -, e Wood Allen, A Autobiografia.

O gosto pela leitura é uma influência da minha mãe. Professora da escola pública em Capela, foi ela quem me ensinou as primeiras letras, antes mesmo da idade escolar da época. Como exercício, me fazia ler de um tudo. De bula de remédio a Machado de Assis. Tomei gosto e me tornei um viciado em leitura.

Gosto de biografias e, ao contrário daquele juiz parcial, tosco e semianalfabeto, me lembro de todas que li. Para provar, destaco algumas das inesquecíveis: Chatô, O rei do Brasil, de Fernando Morais; Antônio Carlos Jobim, de Sérgio Cabral; Getúlio, de Lira Neto; Marighella, de Mário Magalhães; Pureza Fatal, biografia de Robespierre, por Ruth Scurr, entre tantas outras.

Das autobiografias eu tenho um pé atras. Há nelas, via de regra, uma certa necessidade, humana - até entendo -, de se vangloriar. Exaltar suas virtudes e abrandar, até mesmo camuflar, suas imperfeições. Mas, mesmo aí, temos exceções. Palimpsesto, autobiografia de Gore Vidal, é uma delas. A reconhecida habilidade de Vidal como contador de histórias e analista irreverente dos fatos não poupa sua família nem seus amigos, nem a si mesmo.

Outra, acabo de ler agora minutos antes de começar a escrever esse texto, é a autobiografia de Woody Allen. Li de uma única sentada. Avidamente. Voltarei a lê-la novamente. Muitas vezes, tenho certeza. Porque sou assim quando gosto de uma coisa. Não daqui a alguns dias, mas em seguida. Porque li com tanta intensidade que não deu tempo de fazer as devidas anotações.

É preciso dizer que sou admirador, fã, do cineasta Woody Allen. Assisti a todos os seus filmes. E a sua vida, contada por ele no livro, é tão interessante quanto seus personagens neuróticos, frágeis, céticos e, singularmente, bem-humorado.

Não farei spoiler, pois sugiro que o leiam. Numa história que teria tudo para ser dramática, há humor em todas as páginas.



15 novembro 2022

Popó, o revolucionário

 

Popó, é um velho amigo de infância na minha querida Capela. Possidônio Pereira da Cruz, filho de um rico fazendeiro lá das bandas do Cem Passos, desde menino já era um entusiasmado admirador da revolução russa e de outras insurreições ao redor do mundo.

Trotskista convicto e simpatizante de Bakunin, nunca vi Popó sem aquela boina, igual a do Che Guevara, ornamentando sua cabeça. Ele se autodenominava revolucionário e acreditava – ainda acredita - que a luta armada é a única forma de libertação do proletariado.

Enquanto as armas para a revolução não chegam, Popó precisa se virar. Depois de perder o pai fazendeiro para um derrame cerebral e a fazenda para o Banco do Brasil, o rebelde Popó conseguiu, através de um velho usineiro amigo da família, um cargo na burocracia do estado.

Estava ele tranquilo, birô abarrotado de papéis para arquivar, quando ouviu o chamado das ruas. Eram as denominadas “jornadas de junho” de 2013. Ainda tentei chamá-lo a razão:

- Popó, preste atenção, você não vê que esse é um movimento golpista? Uma tentativa de desacreditar o governo popular?

- Popular, Ésse Ésse? – é assim que Popó me chama – popular o quê, cara, onde já se viu um aumento de 0,20 centavos na passagem do ônibus? – continuou Popó em sua fúria revolucionária.

Certamente o bater do torturante carimbo durante os últimos longos anos embotou sua mente e sua capacidade de discernimento. O que importava para ele é que o povo houvera cansado de esperar pelas armas e tinha ido paras as ruas fazer a revolução, e esta deveria ser feita ali e agora, ainda que fosse no muque.

Quando Possidônio acordou era tarde. A tal revolução que ele ajudara a fazer tinha tirado a esquerda do poder e em seu lugar havia colocado a ultradireita fascista, que retiraria todos os direitos e conquistas da classe trabalhadora ao longo do tempo desde Getúlio Vargas. O neoliberalismo venceu e com a contribuição militante do revolucionário Popó. Envergonhado, sumiu. Seus parentes e nós, os amigos, chegamos a pensar que ele havia cometido suicídio.

Por isso minha surpresa ao vê-lo na passeata de Lula em Aracaju no segundo turno da eleição. De camisa vermelha, a velha boina de Che na cabeça, um sorriso cheio de esperança no rosto e um forte abraço de redenção.

Dalí fomos tomar uma cerveja, falar dos velhos tempos e dos que virão. Popó me pareceu mais realista. Acreditava que o momento exigia a somação de todos. Esquerdistas, sociais-democratas, democratas e avançando até ao que ele chamava de direita civilizada. Nesse ponto, eu que nem sou tão revolucionário assim, me arrepiei. Direita civilizada? Tá bom, que seja. Nos despedimos e seguimos na luta.

Depois de uma jornada heroica, Lula é eleito por mais de 60 milhões de brasileiros. Reverenciado pelo mundo inteiro, sua vitória simboliza um ambiente de paz e esperança para o Brasil e para o mundo. Socialistas, sociais-democratas, direita civilizada... todos comemoramos efusivamente.

15 dias depois da eleição de Lula e de um merecido descanso, vou ao Bar do Camilo tomar uma gelada com costela de porco assada, ainda em clima de comemoração da vitória, e lá encontro um infusado Popó.

- Tá vendo, Ésse Ésse, será que Lula não aprendeu nada?

- Mas o que houve, Popó? Que foi que Lula fez?

- Não lê a Folha não?

- Não.

- Ele foi pro Egito num avião de um empresário.

- Oxente, Popó, e tem avião que não seja de empresário?

- Não se faça de tonto, Ésse Ésse, ele foi de favor. Onde já se viu pedir favor a empresário?

- Ah, tá, entendi. Lula não pode ter amigo empresário e muito menos pedir uma carona a ele, né Popó? Pedir favor a empresário é uma regalia que só filho de fazendeiro que tem amigo usineiro possui, né amigo?

- Não entendi sua indireta, mas ele poderia ir num avião de carreira.

- Velho, são mais de 15h de viagem, com trocentas escalas. Além de muito cansativo para um senhor de 78 anos, havia outros riscos envolvidos. Você viu o que os patridiotas fizeram com os ministros do STF em NY? Iriam fazer a mesma coisa ou pior com Lula em todas as escalas, você duvida?

- Num avião da FAB então.

- Sério? Sob o comando do GSI do tal General Heleno que desejou sua morte outro dia? Aquele avião dos 39 kg de cocaína?

 - E aquela mulher dele, a Janja?

- Você quer dizer a companheira do Lula? O que tem ela?

- Onde já se viu uma primeira-dama metida daquelas? Participando da transição, dando entrevista pro Fantástico, vestida numa blusa caríssima... boa era a Marcela Temer que não abria a boca e era recatada e do lar.

- Popó, você é quem não aprende. Se o amigo continuar lendo, vendo e ouvindo, acriticamente, a velha imprensa burguesa vai cair na armadilha de novo. Assim você está, ainda que involuntariamente, ingerindo um veneno cujo efeito é fazer aflorar todo o preconceito de classe do qual você nunca se libertou, mesmo quando travestido de revolucionário.

Pensativo, tomei minha cerveja, comi uma costelinha e fui pra casa com a certeza de que para avançarmos no processo de reconstrução do Brasil teremos que enfrentar muitos adversários: os ultradireitistas, os conservadores e os esquerdistas vulneráveis as narrativas dos conservadores.


14 novembro 2022

Herói

Lula é o grande vulto da história republicana. Goste-se ou não dele, sua saga é heroica. A comparação com a figura que lhe vem em seguida, Getúlio Vargas, mostra que sua trajetória é excepcional e exponencial.

 

Estancieiro nos pampas, Vargas era um quadro da elite desde 1909, quando virou deputado. Depois governador e ministro, deu o golpe de 1930. Foi um caudilho de republiqueta por 15 anos: demagogo, oportunista, sanguinário.

 

Lula comeu pão pela primeira vez com sete anos, ao chegar a São Paulo de pau-de-arara. O pão que o diabo amassou; engraxate, fumava guimbas catadas na rua e usava o banheiro da freguesia de uma birosca. Não tinha onde cair morto.

 

A mística do Vargas Pai dos Pobres vem de seus três anos como presidente eleito. Os trabalhadores melhoraram de vida no período, mas as dádivas lhe foram concedidas por uma casta de pelegos e políticos venais que o chefe populista cevava e cooptava.

 

Já Lula tece sua trama com o povo pobre desde a ditadura. Liderou greves, foi preso e perdeu eleições, mas pelejou sempre pela organização autônoma dos espoliados. Relembre-se: o PT foi criado para enfrentar o patronato e os burocratas dos partidos comunistas, a começar pelo brasileiro.

 

Militares abutres e corvos civis avançaram na jugular de Vargas em 1954. Ele se suicidou e o golpe gorou. Dez anos depois veio a quartelada que arrochou os trabalhadores por décadas.

 

Açulados por Judas-Temer, burgueses, juízes, parlamentares, jornalistas e prelados cravaram os dentes na carótida de Lula em 2017. Provas forjadas, chicanas, mentiras, não faltaram caninos à matilha. Aí Lula teve sua hora alta.

 

Ele não fugiu. Podia ter se refugiado no exterior porque era claro como mil sóis que seria trucidado. Preferiu, disse, ser "enterrado vivo" a permitir que lhe imputassem crimes que não cometera. Teve a fibra de Mandela.

 

Não se cogitava que um dia lhe fizessem justiça. Porque, com covardia infame, Barroso, Carmen, Fachin, Fux, Moraes e Weber aceitaram o cabresto que lhes foi posto pelo comandante do Exército, e cassaram o direito de Lula disputar a eleição de 2018.

 

A cúpula da Justiça reafirmou seu caráter de classe ao decretar que lugar de líder trabalhador é na cadeia. Mais que depressa, a direita dita civilizada aceitou, como uma mula manca, que a extrema direita a cavalgasse. Sem o petista na liça, Bolsonaro venceu.

 

Acharam que Lula purgaria 12 anos de pena e sairia destroçado do cárcere. Ou se desmoralizaria num acordo para ser solto. Mas deu-se o inconcebível, o Supremo liberou Lula. Até para uma Justiça pangaré como a nossa, foi do jamais visto.

 

A justificativa das iminências teve um toque grotesco: levaram três anos para descobrir que Atibaia e o Guarujá —onde estavam o sítio e o tríplex dos quais não havia prova que fosse dono— não ficavam em Curitiba, onde corria a Lava Jato, mas em São Paulo.

 

Lula não deixou a solitária por obra de uma irrefreável campanha de massas. Só meia dúzia de gatos pingados lhe gritava bom dia e boa noite. Contudo, o Supremo abriu sua cela com uma canetada. A boa pergunta é: por quê?

 

Porque Bolsonaro escoiceava a república, trotava sobre os cadáveres da peste e zurrava que, dane-se a democracia, seria ditador. O Supremo, que come e dorme com os maiorais, imaginou a saída para a crise inexorável; deixar Lula livre para promover a boa e velha conciliação.

 

O herói avisou que, mesmo na idade de fazer bilu-bilu nos netos, inflamaria seu povo. Descascaria o abacaxi da campanha e enfrentaria o pepino do governo. Agora os iluminados dizem que ele ganhou graças ao centro, ao TSE e à valorosa elite. Então tá.

 

Essa cantilena é de quem quer tutelá-lo. Foi Lula quem reergueu o centro defunto. Foi ele que afrontou o Estado aparelhado pela gangue bolsonarista. Ao votar maciçamente nele, como disse o sociólogo Celso Rocha de Barros na sua última coluna, "os pobres salvaram a democracia".

 

A história não chegou ao fim. É o que diz o coro em "Édipo Rei", a tragédia de Sófocles, ao ver o herói que salvou Tebas ser moído pelo destino: "Não se diga que um homem é feliz até ele estar morto".

 

Lula também falou de morte no discurso depois de eleito. De improviso, disse: "O povo é a minha causa, e combater a miséria é a razão pela qual vou viver até o fim da minha vida".

 

Como as tarefas à frente são hercúleas, Lula pode ter um fim trágico. Mas não se pode esquecer que, aconteça o que acontecer, o herói da causa popular livrou Tebas da tirania.


Texto de Mario Sergio Conti - jornalista, autor de Notícias do Planalto, publicado no jornal Folha de São Paulo em 04/11/2022.

 


12 novembro 2022

Acabou o mistério

Foi finalmente descoberta a verdadeira identidade da Mister M, também conhecido pela alcunha de Mercado. Trata-se do economista neoliberal, Paul Nokhuldos Zotto.

Britânico de origem plebeia, Paul é neto da famosa Tia Margareth, dona de um pequeno bordel na Downing Street, no baixo meretrício de Westminster, em Londres, Inglaterra. Seu pai, Benito Zotto, marinheiro italiano, operador de convés de um cargueiro siciliano que ancorou no Porto de Londres numa noite chuvosa, aproveitou sua única passagem pela cidade para, no prostíbulo de Tia Margareth, dormir nos braços de sua filha, Elizabeth, a famosa Bethinha Boca de Forno, que por sua vez era filha do também marinheiro, o grego George Nokhuldos.

Garoto prodígio, Paul se dedicou aos estudos, determinado a aprender como ficar rico sem trabalhar. Se formou na Escola de Chicago & Ando, onde chegou a ser professor do atual ministro da economia do Brasil. Fiel ao seu destino, Paul ficou bilionário sem nunca bater ponto e nem um único prego numa barra de sabão.

Traumatizado pela infância miserável em que viveu, Paul fundou a escola do pensamento neoliberal, uma doutrina determinada a acabar com os pobres, baseada no estado mínimo. Segundo a tese do Doutor Paul, o estado só não deve ser zero porque sem ele, os neoliberais não teriam como ficar podres de rico.

Aqui no Brasil, o famoso economista é tão idolatrado que está prestes a virar estátua na Faria Lima em São Paulo. Entre os faria limers, o Paul é tão grande que o chamam de o Rocco Sinfredi da economia. Aliás, essa é outra faceta do neto da Tia Margareth: ele é um tremendo sedutor.

11 em cada 10 editorialistas da nossa “grande imprensa”, já dormiu com ele. Dizem que Miriam Leitão, Dora Kramer, entre outras beldades do jornalismo nativo, dedicam a ele um verdadeiro amor platônico. Suspiram e transpiram por todos os poros a cada vez que seu nome é citado.

Há alguns anos, o PhD Paul, foi professor visitante de uma universidade sergipana. Além de se tornar amigo intimo do reitor, Paul formou muita gente que hoje prega sua doutrina no governo e na iniciativa privada. São hospitais públicos que não atendem os pobres que precisam de cirurgias, são médicos anti SUS, advogados, anti presunção de inocência, jornalistas anti fatos, pastores anticristo, empresário dono de plano de saúde, anti assistência. Recebe a mensalidade do associado, mas não presta o serviço em contrapartida, um festival de ações para, literalmente, acabar com os pobres, como reza a cartilha do famoso economista.

Pelo menos em Sergipe, parece que as lições do Pai do Neoliberalismo vêm dando muito certo. Afinal, no calor dos trópicos, Paul Nokhuldos Zotto é refresco.


                                                            Paul Nokhuldos Zotto
 


10 novembro 2022

Cerveja, um santo remédio

 

Moléculas úteis contra a Alzheimer encontradas no lúpulo da cerveja

Das flores de lúpulo utilizadas para aromatizar cerveja, podem ser extraídas moléculas que podem inibir a agregação da proteína beta amilóide associada ao Alzheimer.

Isto é demonstrado por testes laboratoriais realizados pela Universidade de Milão-Bicocca com a Universidade Estatal de Milão e o Instituto de Investigação Farmacológica Mario Negri. O estudo, publicado na revista ACS Chemical Neuroscience, poderia abrir caminho a novos nutracêuticos contra a neurodegeneração.

As flores de lúpulo já tinham entrado debaixo da lente pela sua capacidade de interferir com a acumulação de proteína beta amilóide.

Os investigadores italianos decidiram, portanto, investigar mais para compreender que compostos químicos dão este poder ao lúpulo.

Para as identificar, produziram e caracterizaram extractos de quatro variedades de lúpulo comuns, utilizando um método semelhante ao utilizado no processo de fabrico da cerveja

Testes em tubos de ensaio mostraram que os extractos têm propriedades antioxidantes e podem impedir que a beta amilóide se agregue nas células nervosas humanas. O extracto mais eficaz é o obtido do lúpulo Tettnang, que se encontra em muitos tipos de Lager e cervejas leves.

Quando o extracto foi separado em fracções, o que continha um elevado nível de polifenóis mostrou a mais potente actividade antibiótica e inibidora de agregação; também promoveu processos que permitem ao organismo eliminar proteínas neurotóxicas desdobradas

Os investigadores concluem que embora este trabalho não justifique o consumo de cervejas mais amargas, mostra que os compostos de lúpulo poderiam servir de base para os nutracêuticos contra a doença de Alzheimer.

 

Fonte: www.stylemania.it


Gestos valem mais que palavras

  Vejam como o governo de Sergipe vai construindo narrativas para justificar suas reais intenções e como elas induzem a opinião pública ao e...