Por Caio Ribeiro
Santos*
Eu
cresci assistindo senhores ranzinzas, com seus cabelos grisalhos e vozes
moldadas pelo cigarro, discutindo futebol na televisão. Criança, eu não
entendia muito bem o motivo deles serem tão contundentes, sorrirem tão pouco e
não se perderem na festa do esporte. Hoje, percebo que eu não sabia nada sobre
jornalismo, poder e futebol.
O
futebol, muitas vezes, é a única felicidade dos infelizes que saem de casa para
as arquibancadas “buscar a vitória que, lá fora, a vida lhe negou a vida
inteira”, como dizia Armando Nogueira. As relações de poder são cruéis. Na luta
de classes, manda quem pode, obedece quem tem juízo e bate de frente quem tem
coragem. É a ferro e fogo que se cria a casca que eu via nos comentaristas da minha
infância.
Mesmo
com as caras fechadas em embates ferrenhos, a fala deles me lembrava a
expressão do futebol: eles comunicavam numa lúdica representação do que era o
esporte. Não tentavam agradar ninguém. Talvez por isso, por essa verdade e
autenticidade que eles carregavam, me agradassem tanto.
Esse
tempo passou. Em 04 de julho de 2023 - dia da Independência dos EUA -, a ESPN
brasileira transmitiu um campeonato de “comer cachorro-quente” entre seus
jornalistas. Uma mistura de complexo de vira-lata com um processo de
Leifertização do jornalismo esportivo brasileiro.
Por
falar em manda quem pode, essa “descontração” descontrolada - a Leifertização -
que vemos hoje nos programas esportivos foi uma barreira rompida por Tiago
Leifert. Tiago não é o dono, mas é filho dele. Seu pai, Gilberto Leifert, foi
durante muito tempo um dos chefões da área de relações comerciais da Globo. Daí
essa aproximação do futebol com o apelo à audiência, à publicidade, ao
marketing e demais termos importados.
E a
chuteira preta, em um passe de mágica, virou um sapatênis cor de
burro-quando-foge. O futebol mudou. O jornalismo esportivo seguiu a onda.
Estão, cada vez mais, amarrados a essas relações de poder. Talvez,
espiritualmente, a minha jovem alma esteja se transformando em um senhor
ranzinza, de cabelos grisalhos e voz moldada pelo cigarro. Só espero não ter
que vendê-la por um hot dog, um par de sapatênis e um job qualquer.
*Caio Ribeiro Santos é estudante
de jornalismo e filho do orgulhoso titular desse blog.